Liberdade de imprensa
diminuiu em "nova era de propaganda"
Actualizado há 3 horas e 27 minutos
Lusa
A liberdade de imprensa
deteriorou-se em 2015, especialmente no continente americano, denunciou hoje a
organização não-governamental Repórteres Sem Fronteiras, alertando para uma
"nova era da propaganda".
O Índice Mundial da Liberdade de
Imprensa dos Repórteres Sem Fronteiras de 2016, divulgado hoje, regista uma
descida em todo o mundo, segundo Christophe Deloire, secretário-geral desta
organização sediada em Paris, com a América Latina como motivo particular de
preocupação.
"Todos os indicadores se
deterioraram. Numerosas autoridades estão a tentar recuperar o controlo dos
seus países, temendo o debate público aberto", disse Deloire à agência de
notícias AFP.
Este 'ranking' lista 180 países
segundo indicadores como a independência dos meios de comunicação social, a
autocensura, a legislação, a transparência e abusos.
"É hoje muito mais fácil aos
poderes dirigirem-se diretamente ao publico através de novas tecnologias e isso
representa um maior grau de violência contra aqueles que representam a
liberdade de imprensa", afirmou Christophe Deloire.
"Estamos a entrar numa nova era
de propaganda em que as tecnologias permitem a disseminação a baixo
custo", acrescentou.
Para os Repórteres Sem Fronteiras, a
situação é especialmente grave na América Latina, com o relatório deste ano da
organização a apontar a "violência institucional" na Venezuela e no
Equador, o crime organizado nas Honduras, a impunidade na Colômbia, a corrupção
no Brasil e a concentração de meios de comunicação social na Argentina como os
principais obstáculos à liberdade de imprensa.
A situação da liberdade de imprensa
em África é melhor do que na América Latina pela primeira vez desde pelo menos
2002, ano em que a organização começou a elaborar a classificação mundial
da liberdade de imprensa.
Segundo o relatório deste ano dos
RSF, globalmente, África é agora o segundo continente com melhor classificação,
atrás da Europa, e supera a América, "fustigada pela violência crescente
contra os jornalistas na América Latina", enquanto a Ásia se mantém com a
pior classificação.
O norte de África e o Médio Oriente
continuam a ser "a região do mundo onde os jornalistas encontram mais
obstáculos de todo o tipo", indica o relatório.
Dos 180 países analisados, a
Finlândia continua a ter a melhor classificação, seguida da Holanda e da
Noruega.
Portugal subiu três lugares,
passando da 26.ª posição, em 2015, para a 23.ª este ano.
A organização destaca a
significativa melhoria da Tunísia, que subiu 30 lugares graças "à redução
das denúncias contra os meios de comunicação e agressões". Também a
Ucrânia subiu 22 lugares "devido à estabilização do conflito" no
país.
Entre as principais quedas, destaque
para a Polónia, que desce 29 postos, para o 47, "devido aos ataques contra
os meios de comunicação" do "partido ultraconservador".
A "deriva autoritária" do
regime do Tajiquistão faz o país cair 34 lugares, os mesmos que o Brunei,
"após a instauração da 'sharia' e das acusações de blasfémia contra os
jornalistas, que fizeram multiplicar a autocensura".
No entanto, as classificações mais
baixas continuam a ser do Turquemenistão, Coreia do Norte e Eritreia.
Para o secretário-geral dos RSF,
Christophe Deloire, "a paranoia que muitos dirigentes do mundo
desenvolveram contra os meios de comunicação" tem muito que ver com o
retrocesso generalizado na liberdade de imprensa.
Fustigados pelo terrorismo,
conflitos armados e crises eleitorais, os jornalistas africanos viram piorar as
suas condições de trabalho, com quedas notórias como a do Sudão do Sul, que
desceu 15 lugares.
Mas a maior deterioração
verificou-se na América, devido "às tensões políticas crescentes em vários
países, alimentadas pela recessão económica e incertezas sobre o futuro".
O crime organizado continua a ser
uma ameaça para os repórteres na maior parte dos países da América Central e na
Colômbia, tornando difícil qualquer tipo de jornalismo de investigação.
A maior queda foi de El Salvador,
que retrocedeu 13 posições, até ao 58.º lugar, uma degradação num país
"carcomido pela violência dos cartéis", que começou em 2014, com a
subida ao poder de Salvador Sánchez Cerén, "que acusa os meios de
comunicação de participarem numa 'campanha de terror psicológica' contra o seu
Governo".
O Panamá, onde "o acesso à
informação continua a ser parcial e está sob o controlo do Estado", perdeu
oito lugares e os RSF assinalam que "a cobertura de assuntos delicados
como a corrupção leva a processos por difamação".
No entanto, os piores países do
continente em termos de liberdade de imprensa para os RSF continuam a ser a
Venezuela e Cuba.
No primeiro caso, a ONG assinala que
"a imprensa de oposição e os meios de comunicação independentes tentam
sobreviver às intimidações e manobras do Presidente, Nicolás Maduro".
Cuba situa-se no lugar 171, perdendo
duas posições, com "um controlo quase total da informação por parte do
regime de Raúl Castro".
A violência institucional do
Equador, o crime organizado nas Honduras, a impunidade na Colômbia, a corrupção
no Brasil, a concentração dos meios de comunicação na Argentina ou a
cibervigilância nos Estados Unidos completam o panorama do continente.
Tal como no relatório de 2015, os
RSF alertam igualmente para a deterioração da liberdade de imprensa na Europa,
em nome da contraespionagem e da luta contra o terrorismo, mas também devido a
uma maior concentração dos meios de comunicação e da influência do poder nos
órgãos públicos.
No entanto, "a Europa é também
vítima dos demónios do mundo", como demonstram os atentados contra o
jornal Charlie Hebdo, em Paris, em janeiro de 2015, assinalam os RSF.